Eu vivo de prestígio e de glória ou como utilizamos as palavras sem nem mesmo pensar nelas


Desde 1874 e o Salão dos Rejeitados já se vão 137 anos e parece que o campo artístico ainda se bate com a questão da validação do artista. O que é uma pena é que muitos ainda a utilizam como desculpa sem se darem conta de que dos impressionistas até hoje houve uma sucessão de artistas que já negaram e esvaziaram a validação como necessária para qualquer coisa.
A questão parece ainda mais superada quando paramos e a enfrentamos com uma série de perguntas triviais, daquelas que deveríamos ter sempre em mente quando algum enganador tenta nos vender um discurso igualmente desonesto: quem valida o artista? O artista precisa ser validado? Para que validar? E afinal de contas, que raios significa validar?
Difícil dar significado fechado e definitivo em um ensaio assim, mas é fácil perceber conversando com diferentes pessoas que, pelo menos no senso comum, ser validado pode ter vários sentidos: ser conhecido ou reconhecido como artista, ser valorizado, ter obras vendidas por uma galeria, ter o trabalho esmiuçado por um crítico, ter exposições individuais ou a glória: participar de uma bienal (preferencialmente São Paulo ou Veneza). Acontece que a arte hoje se constitui em milhares de circuitos, sistemas e universos que não exigem que um artista esteja em Kassel para ser um artista. E não é de hoje. Como dito, os impressionistas já questionavam a validação, que foi derrubada em definitivo por Duchamp e, posteriormente, Beuys.
Com “todos são artistas”, a validação torna-se um recurso/discurso de imposição de poder pessoal/institucional (“eu posso validar” ou “eu [não] reconheço você/seu trabalho”). Mas repetindo: há diversos núcleos, espaços, sistemas da arte. Ser validado em um não significa ser validado em outros. Ou em todos. O que torna mais uma vez a preocupação com a validação inútil, pois, sendo arte, sempre será validada em algum lugar. E, por consequência, torna inútil até mesmo falarmos em validação.
Devemos todos nos preocupar, sim, com quem utiliza esse discurso e com quais interesses: o crítico/curador/instituição/marchand/artista que aponta seu cetro ao outro e o autoriza a falar, de modo a mostrar e fazer a manutenção de seu status elevado de ser especial.
Por último, vale lembrar que o que por muitos é tido como validação do curador ou do crítico, quase sempre se trata de escolha e não validação. O trabalho do curador como uma aproximação e busca de sentidos, tentativa de argumentação e exposição com determinados artistas e obras, mas não como imposição ou certificação, uma chancela de quem é artista. Neste caso, não entrar na escolha ou não participar de determinada exposição não significa uma validação negativa (fulano não faz arte), mas um posicionamento, às vezes infeliz, do crítico ou curador. Logo, o que é feito não é uma validação, mas a inserção em um circuito.
Tomar cuidado com o que falamos ou como falamos deve ser também assunto de atenção. Podemos sancionar coisas que discordamos ou ignoramos por completo.

RAFAEL BUDNI

Um comentário:

Anônimo disse...

Pois é, resumindo, trata-se apenas de um corporativismo comercial como qualquer outro que elege os artistas com "critérios" subjetivos e pessoais. Claro que não é parâmetro para ser considerado artista ou coisa nenhuma, quem entra no sistema é apenas mais um apadrinhado ou sujeito que tem saco de fazer o social com o meio artístico. E o mais irônico dessa história é perceber que quem se sujeita a isso, vai contra a idéia de arte livre, ou arte sem fins comerciais. Então a arte passa a ser tão vazia quanto o artista, que só entra em busca da glória e da grana, já que é tão acessível! Não precisa ter talento nem esforço. Basta fazer qualquer merda pra parecer que tem uma idéia bacana e escrever um texto bacanão (o texto tem q ser mais pensado que a obra), aí quem não "entender" pode ser facilmente taxado como inculto ou sem repertório, e em seguida puxar o saco das pessoas certas. Que vidinha de merda!

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