Muito se falou no LAB sobre as múltiplas formas pelas quais a arte se materializa ou não na arte contemporânea. Essa questão é complexa num momento em que, só para citar o clichê tão verdadeiro, qualquer coisa pode ser arte. Frente a este “qualquer coisa” fica difícil designar o objeto da arte, já que nem a mesmo a materialidade pode dar conta da diversidade de manifestações - a introdução da noção de conceito implodiu tudo isso.
Isso gera, além de muito debate filosófico sobre a natureza da arte, também uma dificuldade para o crítico, ou melhor, para o analista de arte em geral, que acaba não tendo como nomear o seu objeto de análise.
Parto do princípio que toda obra de arte possui uma temporalidade. O esquema simples dessa temporalidade pode ser dividido em duas partes. A primeira parte começa com a concepção da obra artística e tem seu fim na exposição, na abertura dessa obra para o público. Portanto, a primeira parte do devir artístico pertence ao artista e a quem mais ele quiser incluir no processo de construção da obra. A obra enquanto objeto acabado pode ter qualquer forma, ela pode não possuir materialidade intrínseca ou ser concebida para existir somente na interação com os espectadores, mas mesmo isso é resultado de um processo que tem seu FIM na abertura para o público.
Já que a forma da obra não pode ser delimitada, pois não há nenhuma normatividade na questão da forma artística, “obra” e “objeto” se tornam termos levemente inapropriados já que carregam fortemente o sentido de materialidade, o que, como vimos, não é sempre o caso. Por isso, pretendo utilizar daqui por diante o termo COISA DE ARTE, que indica a existência de uma COISA QUE EXISTE (ou existiu, no caso das coisas efêmeras). A tautologia é proposital.
A segunda parte do processo de temporalidade da existência da coisa de arte se estabelece através da relação dos espectadores com a coisa. Esse processo independe, em certa medida, do primeiro. A principal característica da primeira parte é que seu sujeito é fundamentalmente o artista. Já na segunda parte não. O artista pode comunicar e ser entendido perfeitamente no seu propósito artístico ou não, mas o fundamental é que ele não tem controle dessa experiência. Esse processo se estabelece a partir da relação entre espectador e coisa de arte, mas é importante que a coisa de arte não seja conceitualmente descaracterizada como uma geléia de significados que são construídos a partir dela. Os discursos que ela suscita NÃO SÃO a coisa de arte (embora a própria experiência sensível possa ser). A coisa de arte tem existência independente dos discursos construídos sobre ela, e o fato que comprova isto é que a experiência com a coisa de arte pode ocorrer com um espectador completamente leigo, que não tem nenhuma informação sobre os discursos acerca dela.
Natalia Romanovski
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