Como já dizia Da Vinci, a arte é coisa mental, entretanto, talvez por ser algo abstrato, há uma confusão de ideias acerca disso. Uma coisa é a imagem gerada na mente de um espectador de uma obra material já existente; e outra coisa diferente é a chamada arte apenas como conceito, que existe apenas no plano mental, a qual não busca se prender em matéria alguma.
A primeira questão diz respeito a imagens mentais decorrentes de algo que já existe fisicamente. Alguém que visualizou uma obra, onde quer que isso tenha se dado, é capaz de, posteriormente, resgatar a imagem da obra em sua mente. Esse resgate pode ser feito a qualquer momento, evocando para si uma imagem tão igual e fiel aos detalhes da obra física visualizada, que pode inclusive ser equiparada a ela. A obra passa a existir para o espectador mesmo longe dela, no mesmo espaço de tempo que pode existir para outros espectadores e ainda, ao mesmo tempo em que ela permanece resguardada no espaço de exposição. São todas a mesma obra e, no entanto, única, porém, em planos diferentes de existência.
Para Sartre, a imagem mental sempre será menos que a própria obra material. Já Mel Bochner, artista nascido em 1940, acredita que não há diferença alguma entre obra (matéria) e a imagem mental produzida por alguém que tenha visualizado tal objeto. A justificativa é que, fazendo da imagem uma cópia da coisa, ela própria passa a existir como coisa.
Talvez por isso haja hoje certo incentivo à experimentação da obra de arte, em vez da simples tentativa de interpretação. A experiência do espectador com a obra já é uma forma de tê-la consigo, e evocá-la sempre que quiser.
Já a segunda questão, sobre a arte apenas como conceito, faz uma relação diferente com a matéria, uma vez que se desvincula de qualquer forma física, existindo, inclusive, anteriormente a qualquer forma física. Aqui o que há é uma nova forma de arte, onde apenas o conteúdo mental basta.
Umberto Eco, em seu texto Nota sobre a morte da arte, sugere a descrição de uma poesia de forma tão esmiuçada que, ao final já não é mais preciso escrevê-la, pois ela já existe apenas com a explicação.
Toda obra de arte começa com uma ideia, antes mesmo de qualquer iniciativa de realização material. E o que se faz na arte que existe apenas como conceito é parar no plano mental, bastando a própria ideia como obra de arte, onde o que importa é envolver a mente do espectador, e não mais seus olhos.
Para Mel Bochner, a obra conceitual basta por si só no plano mental porque pode ser vivenciada na sua descrição, e ainda é infinitamente repetível. Por outro lado, Peter Lamarque, filósofo, acredita que não é possível conceber uma obra de arte apenas pensando nela, ou falando sobre ela, porque isso geraria uma versão própria da obra em cada indivíduo, alterando-a.
Pode parecer pouco se restringir ao plano mental quando grande parte da sociedade ainda se mantém atrelada à matéria, talvez por questões capitalistas, ou por se sentirem mais seguros junto ao que se pode ver e tocar. Entretanto, acredito que as ideias bastam por si só, sendo o restante encarado como algo excedente. É importante lembrar que é a desconstrução que permite a construção de novos sentidos.
Karol Klassen
Artista Visual, em breve Advogada
karolkl@uol.com.br
2 comentários:
A filosofia existe justamente, para pensar abstratamente sobre as questões. Ao afirmar que as artes visuais podem se propor apenas a trafegar por conceitos, tu estás apenas filosofando e não pensando artisticamente. Porque arte é pensar a partir da matéria, da forma. Não dá pra transformar a arte em filosofia, cada uma tem seu papel. Ingênuo também achar que se desprender da matéria é simplesmente não produzi-la. Visto que somos dotados de percepção sensorial e pensamos racionalmente a partir dessas experimentações sensoriais com a matéria. Ser menos capitalista e desprendido é diferente, seria dar a relevância necessária a matéria, mas não ignorá-la! Hoje acontece muito essa confusão na arte contemporânea, o excesso de teorização sobre as obras e a própria arte (obras autoreferenciais) acabam desmerecendo a prática artística de uma maneira banal. Visto que hoje não existem muitos critérios para se avaliar obras, é feito e experimentado de tudo. Os artistas em grande parte não atravessam processos temporais longos e autocríticos para amadurecer um trabalho com técnicas e métodos. É difícil pensar soluções visuais novas para as idéias, talvez até mais que pensar filosoficamente seus conceitos. Deve ser por isso que os mestres do passado levavam tanto tempo, enquanto os "artistas" de hoje da noite pro dia pintam aí com idéias "maravilhosas" em obras que precisam de textos para validá-las sensorialmente entre um pequeno grupo que finge admirá-las só pra manter um circuito corporativista infantil.
Um grande beijo
Renato Calliari
gostei do comentário! Lailana
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